A pandemia do novo coronavírus está forçando fábricas ao redor do mundo a diminuir ou parar a produção. Essa redução está prejudicando as cadeias de fornecimento globais que normalmente mantêm os países abastecidos com produtos que vão de remédios a alho e meias.

Segundo economistas, parte do problema é que as cadeias de fornecimento de hoje não são suficientemente diversificadas. “Há muitos pontos de estrangulamento onde a produção de certos produtos está altamente concentrada em um país, às vezes em uma cidade ou em uma empresa, e isso gera vulnerabilidade”, afirma Geoffrey Gertz, bolsista do programa Economia Global e Desenvolvimento, do Instituto Brookings. “Certamente vemos isso na China. A pandemia está realmente chamando a atenção para a necessidade de investir mais na resiliência de cadeias de fornecimento.”

David Simchi-Levi, especialista em logística de cadeias de fornecimento do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, explica que estratégias agressivas de corte de custos de anos atrás justificam os desabastecimentos de hoje. “As empresas foram bem-sucedidas em reduzir custos, mas aumentaram significativamente a exposição ao risco”, disse ele. “E se há um problema como o que temos visto nas últimas [várias] semanas, há uma enorme interrupção na cadeia de fornecimento.”

Guindaste leva contêiner para navio de carga (© Alan Diaz/AP Images)
Um guindaste se prepara para deslocar um contêiner para o navio de carga Asian Moon no porto de Miami em 2012 (© Alan Diaz/AP Images)

Simchi-Levi destaca que, nos anos 1980, mais e mais empresas transferiram suas atividades para a Ásia e, em particular, a China. “Elas estavam pensando mais em medidas de corte de custos sem levar em consideração, por exemplo, o impacto do longo tempo de execução, aumentando a volatilidade e riscos na cadeia de fornecimento”, disse ele.

A participação da China no comércio com o restante do mundo aumentou drasticamente, observa Simchi-Levi. Em 2002, durante a epidemia de Sars, a China representava 4,3% do PIB global. Hoje, a China representa 16%, afirmou.

Mapeando as origens das peças dos fornecedores

Além disso, “cadeias de fornecimento, em geral, se tornaram mais complicadas”, afirma Gertz. “Temos mais e mais empresas cada vez mais dependentes de fornecedores intermediários para seus processos de produção.”

David Payne, economista da Kiplinger (editora especializada no mundo dos negócios), relata que crises em cadeias de fornecimento ocorrem além da China*. “Empresas que importam peças ou materiais do Sudeste Asiático estão descobrindo que muitos daqueles fornecedores dependem da China para a obtenção de matérias-primas”, escreve ele, citando fábricas de vestuário cambojanas que foram forçadas a fechar devido à falta de tecidos chineses.

Simchi-Levi afirma que empresas ao redor do mundo deveriam investir mais no mapeamento da cadeia de fornecimento. “Elas não apenas precisam entender seus fornecedores, mas precisam entender os fornecedores de seus fornecedores”, diz ele.

Empresas também precisam diversificar, diz ele. “Certifique-se de que o fornecedor tenha múltiplas instalações de fabricação em regiões diferentes, ou que haja múltiplos fornecedores onde você possa mudar de um para o outro a fim de obter as peças de que precisa. Ou pode aumentar seu estoque mais do que o normal.”

Gertz ressalta que após o terremoto e o tsunami de 2011 no Japão, que resultaram na escassez de produtos, foram feitos esforços para agregar mais resiliência às cadeias de fornecimento. Mas os esforços foram efêmeros. “Sempre há este risco de que somos apenas cientes dessas vulnerabilidades quando elas são jogadas na nossa cara. Estamos felizes de abrir mão de resiliência em favor de eficiência em épocas normais, e depois ter de ser forçado a reaprender essa lição repetidamente”, diz ele. “A real ameaça é que respondemos à crise imediata, mas não colocamos em prática nenhuma medida para evitar isso no futuro.”

Folheto afixado em prateleiras quase vazias contém observação para o limite de unidades dos produtos à venda por pessoa (© Michael Dwyer/AP Images)
Quase todo o estoque de medicamentos sem receita médica se esgotou nesta farmácia de Boston em 3 de abril (© Michael Dwyer/AP Images)

Simchi-Levi crê que, desta vez, as coisas serão diferentes. Ele afirma que as recentes tensões comerciais já haviam motivado empresas a repensar suas cadeias de fornecimento. “Agora, com a pandemia, vai haver uma aceleração da tendência”, afirma. “Quando olharmos a cadeia de fornecimento daqui a dez anos, ela vai ter uma estrutura diferente em comparação com a estrutura que temos visto nos últimos 5 a 10 anos.”

A diversificação vai ser uma “parte essencial da mitigação [de riscos]”, diz ele.

A redatora freelance Linda Wang escreveu este artigo.

* site em inglês