
Quando mil crianças e adultos em uma província rural na República Democrática do Congo foram atingidos por uma desordem muscular que causava muita dor em 2015, os médicos acharam que era um surto de meningite.
Na verdade, os moradores da província foram vítimas de um problema cruel que aflige principalmente os pobres: medicamentos falsificados. De acordo com um estudo publicado na revista médica Lancet Global Health (Saúde Global Lancet, em tradução livre), os congoleses tomaram inadvertidamente um medicamento antipsicótico identificado como Diazepam ou Valium por meio de um rótulo falso. Isso resultou em onze mortes; cinco delas de crianças.
Medicamentos falsificados ou de baixa qualidade continuam a ser um problema global, especialmente em países em desenvolvimento onde medicamentos fortes e rotulados erroneamente podem ser comprados em mercados de rua ilegais ou mesmo receitados inadvertidamente por clínicas, hospitais e farmácias.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) informa que os medicamentos de combate à malária ou antibióticos estão entre os mais comumente falsificados. “Cada incidente é diferente (…) mas basicamente tudo está associado a dinheiro”, afirmou Pernette Bourdillon-Esteve, da OMS, durante um workshop realizado no ano passado.
É um sofrimento em meio ao flagelo da malária, doença tratável que ainda causa a morte de mais de 420 mil pessoas por ano, principalmente de crianças na África Subsaariana.
No caso do Congo, os profissionais dos Médicos sem Fronteiras se convenceram de que a rotulação errônea do medicamento antipsicótico Haloperidol foi deliberada. Após um alerta regional por parte da OMS, descobriu-se que um fornecedor de medicamentos em Kampala, na Uganda, estava enviando os comprimidos falsos de Diazepam.
Soluções
Com uma cadeia de suprimentos global, os países necessitam de reguladores fortes e laboratórios bem-equipados para fiscalizar a fabricação e a distribuição de medicamentos, além de proteger o público contra danos.
A Convenção de Farmacopeia dos EUA, organização sem fins lucrativos que estabelece os padrões relativos à qualidade e à pureza dos medicamentos, está ajudando quase três dezenas de países em quatro continentes a reforçar seus laboratórios nacionais a fim de proteger suas linhas de fornecimento de medicamentos. A Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional subscreve a iniciativa global da convenção, cujo nome é “Promover a Qualidade dos Medicamentos”.
“A maior parte do que fazemos tem a ver com o desenvolvimento de capital humano”, disse Patrick Lukulay, que se concentra em iniciativas africanas para a Convenção de Farmacopeia dos EUA.

A organização orienta os fabricantes locais de medicamentos acerca de boas práticas de fabricação e utiliza seus laboratórios de última geração em Gana, no Brasil, na Índia e na China para testar amostras de medicamentos e compartilhar conhecimentos especializados. “Já capacitamos 250 reguladores em 40 países na África durante três anos”, disse Lukulay.
Detectando os problemas de amanhã
Alguns produtos falsificados são suficientemente sofisticados para enganar os farmacêuticos, mas não as análises químicas. Atualmente, inspetores de campo usam kits de teste baratos que cabem em uma mala a fim de detectar falsificações.
A Convenção de Farmacopeia dos EUA começou a estabelecer padrões de referência para avaliar a força e a pureza dos medicamentos em 1820. Hoje, seus padrões — que também abordam rotulagem, embalagem e armazenamento adequados — são reconhecidos em 140 países.
“Nos Estados Unidos, nós pressupomos que o conteúdo de um frasco é o que deveria estar ali”, disse Kate Bond, vice-presidente de Assuntos Regulatórios Internacionais. Porém, cerca de 10% da equipe composta por 1.100 membros da convenção trabalha no exterior, em reconhecimento do que ela chama de “globalização da rede de suprimento”. (A Organização Mundial da Saúde e vários países e regiões têm farmacopeias próprias. E todas elas trabalham para harmonizar os padrões.)
À medida que mais e mais medicamentos falsificados são vendidos na internet e enviados para além das fronteiras, “todos são afetados por isso”, disse Pernette em uma conferência na Suécia. “Tanto os medicamentos muito caros como os muito baratos têm sido falsificados.”