Por que a China ‘recapacita’ empresários bem-sucedidos?

Autoridades do governo chinês têm afirmado repetidamente que os campos de internamento em Xinjiang proporcionam capacitação profissional e vocacional, mas uma foto amplamente divulgada de um dos campos põe em dúvida essa afirmação.

Recentemente, a Rádio Ásia Livre* (RFA, na sigla em inglês), identificou cinco homens em uma foto de detentos sentados em fileiras cercados por arame farpado instalados em muros em um campo de internamento em Hotan, Xinjiang. Todos os cinco homens já tinham bons empregos e alguns administravam empreendimentos de sucesso. E, de fato, um dos detentos estava planejando abrir uma padaria na zona industrial onde hoje se encontra preso, segundo relatou a Rádio Ásia Livre.

A RFA atribuiu a foto a uma conta que a Administração Judicial de Xinjiang possui no WeChat, aplicativo oficial de mensagens do governo chinês.

Rádio Ásia Livre: detentos uigures identificados em uma foto icônica no campo de detenção em Xinjiang. dlvr.it/R3hPQF @RadioFreeAsia

Os homens estão entre os mais de um milhão de uigures, cazaques étnicos e membros de outros grupos étnicos minoritários muçulmanos detidos nos campos desde abril de 2017. Muitos são supostamente espancados, torturados, forçados a renunciar ao islamismo e a memorizar slogans de propaganda do Partido Comunista Chinês.

Países do mundo todo condenam a China por sua campanha em curso para oprimir as identidades étnicas, culturais, religiosas e linguísticas de suas minorias muçulmanas em Xinjiang. O governo chinês também denominou o campo de internamento de “internato”.

Os homens foram inicialmente identificados em um post no Facebook de Perhat Muhammed, vice-presidente do Congresso Mundial Uigur, sediado nos EUA. E a Rádio Ásia Livre confirmou suas identidades:

  • Mamtimin, empresário e vendedor de equipamentos médicos.
  • Aziz Haji Shangtang, padeiro e dono de restaurante.
  • Eli Ahun Qarim, professor religioso e comerciante de jade.
  • Abdulla Haret, marceneiro.
  • Abduleziz Haji, motorista do Bureau de Seguros Trabalhistas.

Vários dos homens eram conhecidos por suas práticas religiosas, de acordo com entrevistas da Rádio Ásia Livre com seus amigos e familiares.

“Creio que a razão pela qual [Aziz Haji Shangtang] foi preso é que ele realizou um Hajj [peregrinação à Meca, na Arábia Saudita] em 2002”, um dos vizinhos de Aziz disse à RFA. “Eles prenderam todos que viajaram para o exterior.”

“Todos nós ficamos impressionados com o conhecimento religioso [de Eli Ahun Qarim]”, afirmou um ex-sócio empresarial de Eli. “Creio que ele foi detido por causa de seu conhecimento religioso.”

 Longa fileira de homens rezando em pé (© Greg Baker/AFP/Getty Images)
Homens uigures rezando em uma mesquita em Hotan, Xinjiang, em 2015. Desde então, a China reprime a prática religiosa em Xinjiang (© Greg Baker/AFP/Getty Images)

Abdulla Haret era zelador de sua mesquita local em Shipang, disse um vizinho à RFA. “O motivo de sua detenção é provavelmente devido a seu trabalho na mesquita. Ele é um homem religioso e de bom caráter”, afirmou o vizinho.

A China insiste em perseguir muçulmanos em Xinjiang, chegando ao ponto de proibir certos nomes muçulmanos.

“A China descreve esses extensos campos com torres de vigilância e arame farpado simplesmente como ‘centros de formação profissional’”, disse Samuel Brownback, embaixador-geral dos EUA para Liberdade Religiosa Internacional, no mês passado. “Precisamos chamar esses campos do que [realmente] são: campos de internamento criados para dizimar a identidade cultural e religiosa de comunidades minoritárias.”

* site em inglês